Entardecer do meu rio Jacuí...

Entardecer do meu rio Jacuí...
.. posso te afirmar que ¨contar histórias é trazer à baila, trazer à tona¨. Não é uma atividade inútil. Embora haja intercâmbio de histórias, quando duas pessoas trocam histórias como presentes mútuos, na maior parte dos casos elas chegaram a se conhecer bem.Alguns deitaram com a história e descobriram dentro de si mesmos e em profundidade todas as partes que se harmonizavam. Ao lidarmos com palavras e histórias estamos trabalhando com energia arquetípica, que é muito similar com a eletricidade.
Bem-vindo!

quinta-feira, 3 de março de 2011

ROBERTO




Ele entrou na minha sala e jogou-se sobre uma cadeira. Parecia triste. Esperei seu pai também sentar-se e durante os cumprimentos, fixei meus olhos naquela figura. Era gordinho. Não, usamos eufemismos para minimizar uma situação e para sermos falsamente gentis, ele era gordo! Muito jovem, talvez 13 anos. Usava roupas largas e muito frouxas sobre seu corpo suado. Cabeça baixa. O pai então falou: meu filho estava com uma faca na escola por que estava pilchado, e pilcha requer todas as indumentárias. Ignorei aquele comentário desnecessário, tentando diminuir a responsabilidade do menino.
Qual é o teu nome? Roberto.
Roberto, como saístes de casa com uma faca e teus pais nem notaram? Mais uma história de abandono, de carência e de falta de amor.
Ele me explicou tropegamente que era rotulado na escola e que todos os meninos o chamavam por apelidos pejorativos e destruíam assim a sua já baixa autoestima; na última semana tinha sido ameaçado por outros garotos que prometiam lhe bater muito.Por isso armou-se com uma faca que escondeu na mochila e depois dentro da cueca.
O bullyng ( casos em que crianças e adolescentes são vítimas de agressões física ou moral) ganhou recentemente uma versão tecnológica.. O cyberbulling acontece na forma de mensagens negativas em sites de relacionamento, blogs, fotoblogs, e-mails ou em torpedos, através do celular. Essa versão não tem fronteiras e não aceita limites. “ O bullying tradicional é pontual, ou seja, ocorre naquele momento e tende a acabar” (médico pediatra/Aramis Lopes) O cyberbullying é muito mais nocivo e abrangente, pois antes, a vítima era atacada somente na escola, agora com a internet, os perseguidos não se sentem mais seguros em nenhum lugar.
Quem são os verdadeiros culpados pelos atos violentos cada vez mais comuns na juventude? Os pais? Onde a família pode estar errando? A família tem um papel muito importante com função espetacular, pois é uma espécie de espelho no desenvolvimento da personalidade dos filhos. “Se não receberem e aprenderem o que é afeto, carinho, bem-querer e compaixão, desenvolverão frieza afetiva, intolerância, frustrações e incapacidade para suportar diferenças, sendo extremamente egoístas e patologicamente narcisistas”.
Nos últimos tempos, os pais têm repassado essa função para os professores, isso mostra que nestas famílias não há um lar estruturado, nem amor. Não existe dificuldade de diálogo entre as gerações; existe sim, uma confusão de sentimentos possessivos, tais como, ciúme, inveja e raiva. Isso desespera os indivíduos. As pessoas geralmente ocultam esses sentimentos. Mas pensam que ocultam. Por isso as relações com os filhos tornam-se uma farsa, daí, os descendentes “farsantes”.
Atualmente tanto os jovens dos morros quanto os do asfalto apresentam o mesmo linguajar, atitudes, roupas, bagunças, pichações, vandalismos. Essa desigualdade provocou a igualdade. Os jovens do morro têm liberdade, mas desejam o dinheiro que não possuem; os ricos do asfalto têm dinheiro, porém falta a suposta liberdade e libertinagem.
O pai de Roberto falava, falava e falava. Pedi que se calasse. Sua função naquela sala era apenas acompanhar. Roberto era quem tinha que falar; se colocar, se mostrar e saber que naquele momento ele era notado e recebia atenção sobre si e sobre suas palavras.
Lembrei de uma frase, acho que do rapp MV Bill ou do Falcão que diz mais ou menos assim “ quando um garoto pega um fuzil e vai para o semáforo assaltar , naquele momento ele diz: hei, olha pra mim, eu estou aqui; está me vendo agora?”